A Falência do Prazer e do Amor

- Amo como o amor ama.
Não sei razão pra amar-te mais que amar-te.
Que queres que te diga mais que te amo,
Se o que quero dizer-te é que te amo?

Quando te falo, dõi-me que respondas
Ao que te digo e não ao meu amor.
Ah! não perguntes nada; antes me fala
De tal maneira, que, se eu fôra surda,
Te ouvisse todo com o coração.

Se te vejo não sei quem sou: eu amo.


Se me faltas [...]
...Mas tu fazes, amor, por me faltares

Mesmo estando comigo, pois perguntas -
Quando é amar que deves. Se não amas,
Mostra-te indiferente, ou não me queiras,
Mas tu és como nunca ninguém foi,
Pois procuras o amor pra não amar,
E, se me buscas, é como se eu só fôsse
Alguém pra te falar de quem tu amas.

Quando te vi amei-te já muito antes.
Tornei a achar-te quando te encontrei.
Nasci pra ti antes de haver o mundo.

Não há cousa feliz ou hora alegre
Que eu tenha tido pela vida fora,
Que o não fôsse porque te previa,
Porque dormias nela tu futuro.

E eu soube-o só depois, quando te vi,
E tive para mim melhor sentido,
E o meu passado foi como uma 'strada
Iluminada pela frente, quando
O carro com lanternas vira a curva
Do caminho e já a noite é tôda humana.

Quando eu era pequena, sinto que eu
Amava-te já longe, mas de longe...


Amor, diz qualquer cousa que eu te sinta!
-Compreendo-te tanto que não sinto,
Oh coração exterior ao meu!
Fatalidade, filha do destino
E das leis que há no fundo dêste mundo!
Que és tu a mim que eu compreenda ao ponto
De o sentir...?

Fernando Pessoa

2 sutilezas:

Maldito disse...

Não conhecia essa do Pessoa,..muito excelente!

. disse...

Realmente excelente.Aliás, Pessoa nunca foge à excelência da descrição do indiscritível.Só ele é capaz de me fazer sentir coisas que, por mais que eu as vivesse,não as sentiria tão em seu âmago, com tanta profundidade e compreensão.Pessoa é eterno.Ou finito, desde que para isso sejam finitos também os sentimentos :)

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